segunda-feira, 23 de novembro de 2020

A mensagem atual de Aparecida

O Papa Francisco, em carta aos bispos da América Latina em 2017, diz que Aparecida é uma escola para aprender a seguir Jesus. E ele destaca três características.

(1) Os pescadores: são pessoas para encaram o dia a dia, enfrentando a incerteza do rio. Vivem com a insegurança de não saber qual seria o “ganho” do dia. Eles conhecem tanto a generosidade do rio, quanto a agressividade das águas nas enchentes. Acostumados a enfrentar os desafios da vida com teimosia, não deixam de lançar as redes. Esta imagem nos aproxima do centro da vida de tantos irmãos nossos. Pessoas que, desde cedo até a noite, saem para ganhar a vida, sem saber qual será o resultado. O que mais dói é ver que enfrentam a dureza gerada por um dos pecados mais graves do nosso Continente: a corrupção. Essa corrupção que arrasa com vidas, mergulhando-as na mais extrema pobreza. Corrupção que destrói populações inteiras, submetendo-as à precariedade. Como um câncer, vai corroendo a vida cotidiana de nosso povo. E aí estão tantos irmãos nossos que, de maneira admirável, saem para lutar contra este flagelo. 

(2) A Mãe. Maria conhece bem a vida de seus filhos.  Está atenta e acompanha a vida deles. Maria “vai onde não é esperada. No relato de Aparecida, nós a encontramos no meio do rio, cercada de lama. Aí, espera seus filhos, está no meio de suas lutas e buscas. Não tem medo de mergulhar com eles nas situações difíceis da história e, se necessário, sujar-se para renovar a esperança”. Maria aparece onde os pescadores lançam as redes, ali onde as pessoas tentam ganhar a vida. Como mãe, está junto delas. 

(3) O encontro. As redes se encheram de uma presença que deu aos pescadores a certeza que eles não estavam sós em sua labuta. Era o encontro desses homens com Maria. Depois de limpar e restaurar a imagem, levaram-na a uma casa onde ela permaneceu um bom tempo. Nesse lar os pescadores da região iam ao encontro de Aparecida. “E essa presença se fez comunidade, Igreja. As redes não se encheram de peixes, se transformaram em comunidade”. 

Em Aparecida, encontramos um povo forte e persistente. Consciente que suas redes, sua vida, está cheia da presença Maria, que o anima a não perder a esperança. Uma presença que se esconde no cotidiano, nesses silenciosos espaços nos quais o Espírito Santo continua sustentando nosso Continente. Tudo isto nos apresenta sua mensagem, que devemos acolher.

Para terminar, Francisco nos diz: “viemos como filhos e como discípulos para escutar e aprender o que hoje, 300 anos depois, este acontecimento continua nos dizendo. Aparecida não nos traz receitas, mas chaves, critérios, pequenas grandes certezas para iluminar”. E sobretudo, acender o desejo de voltar ao essencial da nossa fé. Amém!

 

terça-feira, 8 de setembro de 2020

Nascimento de Maria

 Nós gostamos de comemorar o aniversário das pessoas da família, de amigos e amigas. Um simples bolo com velinhas, muita alegria e a presença de quem amamos são suficientes para fazer a festa. Tem gente que lembra não somente o dia da morte de pai ou da mãe, ou dos avós, mas também a data do seu nascimento. Ah, se ele estivesse vivo hoje, faria 100 anos! Recordar o nascimento é momento de agradecer a Deus o dom da vida da pessoa e reconhecer suas qualidades.

Conhecemos o dia do nascimento de alguém por causa do seu registro civil. Mas antigamente não era assim. Quando a cristianismo começou a se consolidar, nos primeiros séculos da nossa era, não se sabia exatamente o dia do aniversário e da morte dos santos. E a Igreja determinou algumas festas litúrgicas dando um novo sentido a algumas datas que já existiam. Por exemplo: o nascimento de Jesus foi fixado em 25 de dezembro, pois era o dia da festa do Deus sol em algumas culturas. Para nós, cristãos, Jesus é a luz de Deus que brilha no mundo!

A bíblia começa a contar sobre a mãe de Jesus no capítulo 1 de Lucas. Ali se diz que ela era uma jovem, moradora de Nazaré da Galileia, prometida em casamento a José. Aproximadamente 150 anos depois, surgiu um escrito apócrifo, chamado “Evangelho da infância de Maria”. E logo a seguir, o “Protoevangelho de Tiago”. Esses textos são de autores desconhecidos e tem pouca base histórica. Foram criados para responder as algumas perguntas dos cristãos. Originaram-se de um grupo herege, chamado “gnóstico”. Mas seus escritos nos serviram, pois nomearam o pai e a mãe de Maria, como Joaquim e Ana. Apesar dos exageros e dos erros doutrinais, eles contam que desde pequena Maria era uma menina abençoada e iluminada.

Não sabemos exatamente o dia e o ano em que Maria nasceu. No século 5 começou no oriente a devoção ao nascimento de Maria. O dia 08 de setembro marcava o início do ano litúrgico em algumas igrejas. E nada melhor do que começar lembrando o nascimento da mãe de Jesus. Para nós não importa o dia exato. Como fazemos com as pessoas que amamos, nós recordamos com alegria e gratidão que Maria foi bem-vinda a este mundo. Que a missão dela foi bela e inspiradora para homens e mulheres de todos os tempos.

A liturgia católica comemora o nascimento somente de dois santos: João Batista (24 de junho) e Maria. Ambos preparam a vinda de Jesus. O dia 08 de setembro é ocasião de agradecer a Deus pela vida e a missão de Maria, que continua presente no meio de nós. Viva Maria, mãe e discípula de Jesus. Viva Maria, nossa mãe e companheira na fé!

domingo, 31 de maio de 2020

Visita de Maria a Isabel (em tempos de coronavírus)


Logo após receber o anúncio do anjo, Maria saiu apressadamente em direção da casa de Zacarias e Isabel. Deve ter feito um longo caminho, a pé ou no lombo de um burrinho. Viajou junto com outras pessoas que iam para o mesmo destino, pois as mulheres, numa sociedade patriarcal não podem andar sozinhas. Se Isabel morava no povoado de Aim Karim, o percurso seria de mais ou menos 32 horas. Nesses vários dias de caminho, Maria deve ter pensado e rezado muito. E quando chegou lá e entrou na casa de Isabel, a emoção foi muito grande. As duas se saudaram com beijos e abraços, olharam olhos nos olhos, e neste encontro circulou uma grande alegria. Ambas ficaram cheias do Espírito Santo. Isabel sentiu o filho se mexer dentro dela. Proclamou que Maria era a “bendita entre as mulheres” (Lc 1,41-45). Já Maria respondeu, entoando um cântico de louvor, de profetismo social e de recordação da fidelidade de Deus para seu povo (Lc 1,46-56). E as duas ficaram juntas alguns meses.

Imagine se Maria quisesse visitar Isabel hoje. Devido à ameaça do coronavírus, ela não poderia sair de casa e andar pelos caminhos da palestina, junto com muita gente. Maria pensaria em Isabel, que sendo idosa, estava no grupo de risco. Então, ela acharia um jeito de se fazer presente. Talvez teceria uma roupinha para o bebê e estaria em sintonia da oração. Deixaria para ir ao seu encontro quando tudo se acalmasse. Se fosse após o nascimento de Jesus, o encontro das duas mães com seus filhos seria uma festa!

Nos últimos meses aconteceu algo inesperado. Por causa do bem coletivo, da saúde de todos, foi preciso reduzir a mobilidade e ficamos em casa. Quem está animado pelo mesmo espírito de serviço de Maria, descobriu maneiras de exercitar a solidariedade e a entreajuda. Deu sinais de amor, mesmo à distância, para quem padece de solidão. Colocou seus talentos a serviço. São tantos exemplos bonitos. Vivemos a visitação sem fazer visita! Para cada ocasião, encontramos maneiras de mostrar que estamos todos em conexão. E colaboramos uns com os outros. Maria, mãe da solidariedade, rogai por nós.

quinta-feira, 14 de maio de 2020

Prece a Maria na Pandemia


Maria da Pandemia,
Rogai pelos que estão entubados nos hospitais,
Buscando um pouco de ar para sobreviver,
Agonizando e morrendo na solidão.

Rogai por seus familiares e amigos,
Nessa hora de angústia,
Quando a dor é maior.
E a esperança menor.

Rogai pelos médicos, enfermeiras,
Profissionais da limpeza, religiosos,
Todos os que cuidam dos contaminados.

Livrai-nos da indiferença e dos indiferentes,
Dos adoradores da morte,
Dos que celebram as desgraças alheias,
Dos que deveriam ser os primeiros em responsabilidade
E se colocam de forma fria e sórdida diante desses tormentos.

Rogai para que Deus ilumine os cientistas,
Que seja encontrado rapidamente um caminho
Para neutralizar a ação do vírus.

Quando tudo passar,
Que o ar permaneça limpo,
Que as águas permaneçam puras,
Que as florestas permaneçam em pé,
Que nossas ruas tenham o silêncio da paz,
Que nosso céu permaneça azul
Que todas as formas de vida continuem celebrando sua liberdade
Que a humanidade aprenda que a Terra não é lugar só da humanidade.
Que todos vivemos em uma Casa Comum
Amém!

Roberto Malvezzi (Gogó)

domingo, 3 de maio de 2020

O Cântico de Maria (Magnificat)

Como é bom cantar! Santo Agostinho dizia que os cânticos religiosos são uma oração em dobro. No tempo de Jesus, as pessoas entoavam de cor vários hinos e Salmos, que hoje encontramos na Bíblia. Nos grandes momentos de festa, o canto era acompanhado de danças. Se você abrir o livro dos Salmos, encontrará várias expressões de oração: louvor, ação de graças, pedido de perdão, recordação da atuação de Deus na Criação e na libertação do povo, preces de confiança, clamor  o sofrimento e na perseguição, renovação do compromisso da aliança, ditos de sabedoria, orações dos peregrinos para o templo. O evangelho de Lucas nos oferece também algumas orações e cânticos: do pai de João Batista (Lc 1,67-79), do velho Simeão (Lc 1,29-32), de Jesus (Lc 10,21), e de Maria (Lc 1,46-55).

O cântico de Maria foi chamado pelos católicos de “Magnificat”, por causa da primeira palavra de sua tradução em latim.  Ela significa: engrandecer, exaltar, reconhecer como Deus é magnífico! Imagine a cena: Maria chega na casa de Isabel e Zacarias, cansada da viagem, mas radiante de alegria. Saúda sua parenta: Shalom! A paz esteja com você! As duas mulheres, uma jovem e a outra, idosa, se abraçam carinhosamente, trocam uns beijos no rosto. Isabel proclama que Maria é feliz, por que acreditou na promessa de Deus! (Lc 1,45). A reação de Maria não podia ser outra: começa a louvar a Deus por aquilo que estava acontecendo com as duas. Então, ela lembrou do Canto de Ana, a mãe de Samuel (1 Samuel 2,1-11). Essa mulher era estéril, e por causa disso era humilhada e deixada de lado. Quando Deus lhe deu a graça de um filho, ela cantou os louvores de Deus e afirmou, com valentia, que o poder dos fortes foi quebrado e que os fracos sairão da opressão e serão promovidos.

Mas Maria não repete simplesmente o passado, e espontaneamente ela vai mudando a letra da música. Como Ana, ela exulta de alegria em Deus, salvador! Vai além. Reconhece que o Senhor fez maravilhas nela. Isso não é motivo de orgulho, e sim de gratidão. Ela diz para Deus: olha, como estou muito feliz, pois sinto que Sua misericórdia se estende a todos os que O respeitam (Lc 1,50)! A seguir, Maria canta a Deus com a força e a esperança dos profetas: Os poderosos não ficarão para sempre nos seus tronos! O Senhor fará justiça aos pobres e pequenos. Todos terão direito a uma vida digna, a começar da alimentação (Lc 1,51-53)! Assim, ela já antecipa as bem-aventuranças e as advertências de Jesus (Lc 5,20-24). E, por fim, como Maria se sentia membro do seu povo, ela agradece porque Deus é fiel às suas promessas. Nós fazemos parte dessa história! Deus nos socorre e nos acompanha!  Desde a hora que Abraão sentiu o apelo do Senhor, deixou tudo e partiu com sua mulher em direção à nova terra (Lc 1,54-55).

Eu imagino que enquanto cantava, Maria chamou Isabel para dançar, numa ciranda que vem até nós, hoje! Nessas duas mulheres grávidas até hoje a humanidade se reconhece como capaz de gerar vida, cuidar dela, resistir, estabelecer laços de ternura e recriar a esperança. Vamos cantar os louvores de Deus, com Maria! Vamos proclamar a justiça e a misericórdia de Deus. Amém!

sexta-feira, 10 de abril de 2020

Maria junto a Cruz


Uma característica decisiva do seguidor(a) de Jesus é o compromisso de vida que se prolonga no tempo, enfrentando as crises. Nas palavras do mestre: “permanecer em mim e eu nele” (Jo 6,56; 15,4) ou “permanecer no meu amor” (Jo 15,9). Jesus deseja estabelecer uma sintonia profunda, comunhão de mente e de coração com a sua comunidade. Tal é o sentido da imagem da videira e dos ramos (15,1-11). “Se vocês permanecerem na minha palavra, serão verdadeiramente meus discípulos. Vocês conhecerão a verdade, e a verdade fará de vocês pessoas livres” (cf. Jo 8,31s). Trata-se de uma atitude constantemente renovada: “Quem pretende permanecer nele, deve também percorrer o caminho que Jesus andou” (1 Jo 2,6).
Maria está junto à cruz de Jesus no dia de sua morte. Ela apareceu no início de missão de Jesus, em Caná (Jo 2,1-11), levando seus discípulos a acreditarem nele. Agora, volta de novo à cena. Dessa vez, no final de sua vida pública, mas não há nenhum sinal extraordinário. Ao contrário, o momento da cruz desafia a fé de qualquer um. Maria faz parte do pequeno grupo que perseverou, que não fugiu no momento da perseguição e da crucifixão de Jesus. É a corajosa companheira de Jesus, que permanece no seu amor. Imaginamos que ela se manteve de pé, o que significa persistência e constância na adesão.
Junto com Maria há outras mulheres: sua irmã, Maria de Cléofas, e Madalena, a discípula amada e primeira testemunha da ressurreição. Sobrou somente um homem, o discípulo amado.  Estas pessoas seguem os passos de Jesus até o final, como aprendizes, companheiros e amigos (Jo 15,15).
Maria permaneceu ao lado de Jesus na cruz porque andou no mesmo caminho dele, durante toda a vida. No início, como mãe e educadora, ela dava a direção e orientava. Quando Jesus se tornou adulto e partiu para a missão, Maria não ficou em casa curtindo a saudade, nem interferiu na sua atuação. Ela participou da nova família de Jesus, daqueles que escutavam sua palavra e a colocavam em prática (Lc 2,22). Portanto, a presença junto da cruz é a culminância de um vínculo estabelecido durante toda a vida.
Manter-se junto à cruz é gesto silencioso e profundo. Quando a dor é muito grande e a situação não tem explicação, não adianta falar. Basta a presença. Maria, as mulheres e o discípulo amado são os únicos que perseveram nesta situação tão difícil. Permanecem com Jesus e em Jesus, em público. Participam dos riscos e do escândalo de sua morte de cruz.
Maria, ensina-nos a andar no caminho de Jesus. Mantém-nos junto a Ele, perseverantes nas crises e dificuldades! Amém!

quarta-feira, 8 de abril de 2020

Marias das Dores

Seu nome é “Maria das Dores”. Amigos e parentes a chamam carinhosamente de “Dozinha”. Ela se casou com aquele que acreditava ser o homem de sua vida. O marido era infiel e dependente de bebida. Depois de alguns anos, deixou-a sozinha, com três crianças para criar. “E a vida foi uma luta só”, conta Dozinha. Sem desanimar, ela aprendeu a ser pai e mãe ao mesmo tempo. E o tempo passou. Os filhos crescerem. Ela tinha uma especial afeição por Rodrigo, o filho mais novo, que era carinhoso com ela.
Numa trágica sexta-feira, Rodrigo chegou em casa tarde. Comeu rapidamente, deu-lhe um beijo e disse que ia sair com os amigos. Seu coração de mãe sentiu um aperto. Veio uma dor forte, intensa, como nunca tinha acontecido. Dozinha começou a rezar umas Ave-Marias. Escutou então uns estampidos de tiros. Logo chegou a vizinha e lhe disse: “Seu filho foi baleado”. Dozinha correu, rezando e chorando. Encontrou o filho ensanguentado. Segurou-o nos braços, já sem vida.
A morte do filho provocou uma profunda crise de fé em Dozinha. Primeiro, ela se sentiu anestesiada. Depois, veio a grande sensação de perda, sem volta. Ela começou a clamar, a brigar com Deus. Sua longa vida de cristã, com muitas certezas, parecia ter se dissolvido. Então, lembrou-se da mãe de Jesus. Imaginou a sua dor na hora da cruz, o abandono que ela viveu. E pensou: “Nossa Senhora me entende”. Assim, Dozinha passou a rezar para que Maria lhe desse a força para “sair do túmulo” e viver novamente.
 “A vida de Maria não acabou na sexta-feira da paixão. A minha também não vai terminar desse jeito”. Ao olhar para Maria, Dozinha vê a mulher forte, que não cedeu diante da dor e do sofrimento. Enfrentou-os com a cabeça erguida. Maria se tornou a mãe que lhe dá colo, a amiga entre as amigas. “As coisas ainda não estão resolvidas, mas fiz as pazes com Deus”.
A devoção popular desenvolveu o título de “Nossa Senhora das Dores”. Ele não pode ser uma forma de justificar as injustiças. Ou de manter a resignação diante da dor. Ao contrário. Maria se mostra como a mulher forte, que enfrenta com energia as adversidades, junto com José e com Jesus. Os evangelhos nos falam destas dificuldades, como a matança das crianças inocentes, a fuga para o Egito, a vida em terra estrangeira, a perda do menino no templo. E, para terminar, a dor na hora da cruz.
A partir de Jesus, nos sentimos solidários com todos os homens e mulheres que padecem. Afirmamos que Jesus é nossa esperança, o vencedor. Maria testemunha esta vitória de Cristo e nos acompanha como mãe amorosa. Como faz com Dozinha e tantas outras pessoas. Mãe das Dores, rogai por nós!

domingo, 1 de março de 2020

Maria no documento de Puebla


Os bispos do Continente latino-americano construíram uma história original após o Concílio Vaticano II. 

No Documento de Puebla (1979), Maria é apresentada como Mãe da Igreja (DP 286-291), modelo dos fiéis e da comunidade cristã (DP 292-299), referência para o serviço eclesial à sociedade (DP 300-303). Ela nos conduz a Jesus. Enquanto peregrinamos, Maria será a mãe educadora da fé (LG 63). Ela cuida que o Evangelho nos penetre intimamente, plasme nossa vida de cada dia e produza em nós frutos de santidade. Ela precisa ser cada vez mais a pedagoga do Evangelho na América Latina (DP 290).

Puebla aponta os traços do perfil de Maria, que são orientam homens e mulheres do nosso tempo. Dentre eles, citamos:
(a) Presença feminina, que cria o ambiente de família, o desejo de acolhimento, o amor e o respeito à vida (DP 291);
(b) Fidelidade à palavra dada e companheira de Jesus em todos os caminhos (DP 292);
(c) Doação generosa e cheia de lucidez (DP 292);
(d) Cooperadora ativa e criativa, protagonista da história (DP 293);
(e) Toda de Cristo e toda servidora aos homens e mulheres (DP 294);
(f) Pessoa que articula a contemplação e a missão (DP 294). Assim, Maria “desperta o coração do filho adormecido em cada homem” (DP 295). 

Puebla retoma a afirmação de Paulo VI: “Maria é a discípula perfeita que se abre à palavra e se deixa penetrar por seu dinamismo. Quando não a compreende e fica surpresa, não a põe de lado; mas medita-a e conserva-a. E quando a palavra lhe soa dura aos ouvidos, persiste no diálogo de fé com Deus” (DP 296).
O Magnificat é espelho da alma de Maria. Neste poema a espiritualidade dos pobres de Javé e o profetismo chega ao máximo (DP 297). Em um contexto turbulento, marcado por estruturas que perpetuam a pobreza e a marginalização social, Maria é modelo dos que não aceitam passivamente esta situação e se empenham por mudanças (DP 297,302).

Meus irmãos e irmãs, que Maria nos anime a viver hoje a dimensão social do Evangelho! Amém.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Maria, nossa mãe e irmã na fé

Há uma grande devoção a Maria nos povos latino-americanos e caribenhos, nesse continente que abrange desde o México até o sul da Argentina, incluindo as ilhas e países da América Central. Essa devoção mariana é fruto de um longo processo de inculturação da fé. Durante séculos a piedade Mariana se desenvolveu com diferentes expressões cultuais, como novenas, romarias, coroações, danças, músicas e consagrações. Nelas se acentua a dimensão divina de Maria, com muitos títulos, como “Guadalupe” (México), “Copacabana” (Bolívia), “Lujan” (Argentina) e “Aparecida” (Brasil). No entanto, a generosidade dos missionários europeus e o desejo sincero de evangelizar se misturaram com uma certa dominação cultural, que não levou em conta a originalidade e a dignidade dos povos indígenas e afro-descendentes.

Maria é venerada como Mãe de Deus e nossa mãe. Nos países de linha espanhola, é chamada de “A Virgem” e no Brasil, de “Nossa Senhora”. No entanto, pouco se conhece sobre Maria de Nazaré, seu caminho de fé no seguimento de Jesus. Ou seja, se reza a Maria, mas se fala pouco sobre como ela viveu o Evangelho anunciado por seu filho. Às vezes se projeta sobre a mãe de Jesus as características da mulher na sociedade machista e colonial: a mãe que fica em casa cuidando dos filhos,  a mulher obediente e submissa, calada e recatada. A passividade e a “vida escondida”. Ora, isso não corresponde mais ao perfil de grande parte das mulheres, que hoje estudam, trabalham, participam da vida pública, são ativas e desejam ser respeitas em sua dignidade.

A Igreja percebeu isso. Lentamente, ela recobrou o necessário equilíbrio entre uma devoção sadia à Mãe de Jesus e a descoberta de suas qualidades humanas e espirituais, apresentadas nos Evangelhos de Lucas e João. Maria se torna uma referência de vida não somente para as mulheres, mas sim para todos os cristãos. Assim se realiza o que propõe Paulo VI no documento sobre o Culto a Maria, de 1975:
Antes de mais nada, a Virgem Maria foi sempre proposta pela Igreja à imitação dos fiéis, não exatamente pelo tipo de vida que ela levou ou, menos ainda, por causa do ambiente sócio-cultural em que se desenrolou a sua existência, hoje superado quase por toda a parte. 
 Mas sim, porque, nas condições concretas da sua vida, ela aderiu total e responsavelmente à vontade de Deus (cf. Lc 1,38); porque soube acolher a sua palavra e pô-la em prática; porque a sua ação foi animada pela caridade e pelo espírito de serviço; e porque, em suma, ela foi a primeira e a mais perfeita discípula de Cristo, o que, naturalmente, tem um valor exemplar universal e permanente (Culto a Maria, 35).

O próprio Papa Paulo VI dizia que Maria não é somente nossa mãe, mas também nossa irmã na fé. Ela faz parte do grupo de seus discípulos e discípulas. Ensina e aprende com seu Filho Jesus. Então, ele nos convida a conhecer mais Maria de Nazaré, com as características que são apresentadas nos Evangelhos de Lucas e João.
Assim, nossa devoção a Maria se fortalece com as bases da Bíblia e se torna mais madura e dirigida a Jesus Cristo.