domingo, 2 de maio de 2010

Maria de Nazaré da Galiléia

O Evangelho de João narra uma cena pouco conhecida. Filipe encontra Natanael e lhe diz que encontrou o “Escolhido de Deus” (messias), Jesus de Nazaré. Natanael lhe responde, com descrédito: De Nazaré pode vir alguma coisa boa? (Jo 1,45). Em outra cena, os chefes dos sacerdotes e o grupo dos fariseus afirmam: “Examine, e você verá que da Galiléia não surgiu nenhum profeta” (Jo 7,52). Nazaré e Galiléia estavam foram do centro das atenções.

No tempo de Jesus, a palestina estava dividida, do ponto de vista cultural e política, em três regiões: ao Norte, a Galiléia; ao centro, a Samaria; e ao Sul a Judéia. Embora tivesse uma situação melhor que a Samaria, habitada por um grupo religioso não-judeu, a Galiléia não era vista com bons olhos pelos judeus da religião oficial. O Norte da Palestina esteve ocupado por outros povos, durante o exílio. Então, naturalmente, quando os judeus voltaram a habitar na região, foram incorporando alguns elementos culturais ali presentes. O povo da Galiléia não era considerado pelas autoridades de Jerusalém como aquele que seguia plenamente a lei judaica da pureza. A palestina também era tida como uma região politicamente efervescente. De lá haviam saído vários grupos rebeldes ao poder romano, como aquele comandado por uma tal Judas, o Galileu (At 5,37). Por isso, Pilatos manda colocar sobre a cruz de Jesus uma frase cheia de ironia: “Jesus Nazareno, rei dos Judeus” (Jo 19,19).

No entanto, é na Galiléia que Jesus vive grande parte de sua missão. Lá amadurece seu projeto de vida. Percorre vilas e povoados durante três anos, anunciando o Reino de Deus. Forma seus discípulos nos caminhos empoeiradas da Galiléia, nas montanhas e nos lagos. E, quando ressuscitado, volta glorificado para lá, chamando os seus seguidores para virem ao seu encontro (Mt 28,10.16).

O que significa tudo isso para Maria? Quando Lucas descreve a vocação dela, faz questão de situar: O enviado de Deus foi enviado à Nazaré da Galiléia, e uma moça prometida em casamento a José (Lc 2,4). Nazaré faz parte da identidade de Maria. Ela vem de uma cidade simples e desconhecida, próxima à Fenícia (hoje, o Líbano), num ambiente de diversidade cultural e religiosa e esperanças de mudanças. O evangelho a apresenta assim: Maria de Nazaré. Mais tarde, escritores incomodados com essa simplicidade de Deus, pintarão a anunciação no templo de Jerusalém. Colocarão Maria ao lado dos sacerdotes, quase como uma monja. Mas isso não traduz o anúncio do evangelho.

Hoje, em tempo de celebridades, de supervalorização dos centros urbanos, da cultura do sucesso e da imagem, é bom se lembrar desta expressão: “Maria de Nazaré”. Para Deus, não importa a aparência, o lugar de proveniência, os títulos. Conta sobretudo a qualidade do gesto. E nisto, Maria de Nazaré tem muito a nos ensinar. Amanhã veremos....

Um comentário:

Fabrício Ferreira disse...

A grande coisa que aconteceu em Nazaré, depois da saudação do anjo, é que Maria de Nazaré acreditou e tornou-se assim “Mãe do Senhor”. Não há nenhuma dúvida de que este acreditar se refira à resposta de Maria ao anjo: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38). Esta palavra de Maria representa o ponto alto de uma atitude diante de Deus, porque significa, da maneira mais elevada, a passiva disponibilidade junto com a prontidão ativa. Reconhecer o querer de Deus e aceitar que ele aconteça na própria vida, conforme esta vontade. Orígenes, um grande teólogo de século III, escreveu, como se Maria dissesse a Deus: “Eis-me aqui, sou uma tabuazinha para escrever: o Escritor escreva o que quiser, faça de mim o que quiser o Senhor de todas as coisas”. Mas Maria fez uma pergunta séria ao anjo: “Como se fará isto se eu não conheço homem?” (Lc 1, 34). Ela não pede uma explicação para entender, mas para saber como executar a vontade de Deus. Quer saber como comportar-se. Assim, ela nos mostra que, em alguns casos, não é lícito querer entender, a todo custo, a vontade de Deus, ou o porquê de algumas situações; é lícito, no entanto, pedir a Deus luzes e ajuda para cumprir essa vontade.