Na Bíblia, “bênção”, “abençoar” e “bendizer” estão por toda
a parte. Para os judeus, a bênção significa a comunicação de vida, concedida por Deus (Num 6,23). E eles não separam o espiritual
do material. Por causa da vida que Deus nos dá, todo o povo recebe energia,
alegria, paz, esperança, cura, fertilidade nas plantas, nos animais e nas
pessoas, e justiça nas relações. Quem tem a bênção de Deus deve comunicar para
os outros. Assim acontece com o pai e a mãe, que abençôam os membros da família
(Gn 9,26) e com as autoridades (sacerdotes, profetas e os reis). A bênção é a
vida de Deus, que a gente sente como o perfume no ar. Ela brota como água de
nascente e fecunda toda a criação. No relato de Gênesis 1, o Criador abençoa as
aves, os peixes, o homem e a mulher. E Deus promete a Abraão: em Ti serão abençoados todos os povos da
Terra (Gn 12,3). Quem espalha a bênção, se torna “bendito” e bendiz o
Senhor. “Que eu bendiga ao Senhor e não me esqueça de nenhum de seus
benefícios” (Sl 103,2). Como é importante a gratidão!
O contrário da bênção é a maldição. Ela se traduz por
infelicidade, brigas, violência contra os fracos, falta de comida, maldade,
afastamento de Deus. Como o povo da bíblia não conhecia a medicina, também
pensava que toda doença era uma forma de maldição. Por isso, se pedia a bênção
para curar enfermidades e livrar da morte. Os seguidores de Jesus perceberam
que a bênção de Deus é gratuita e nos encanta. Eles usam mais a palavra “Graça”
(2 Cor 13,14). Quem recebe a bênção de Deus é agraciado. Assim, Lucas diz que
Maria é “cheia de Graça” (Lc 1,28), a bendita entre a mulheres (Lc 1,39).
Os 300 anos de Aparecida testemunham muitas bênçãos. A
devoção começa simples, como uma nascente. Os primeiros frutos são a fartura
dos peixes, que alimentam também a todos. Cria-se uma pequena comunidade em
torno da imagem. O escravo fugido é libertado de suas correntes. No correr dos
anos, os devotos recebem muitas graças: curas de doenças graves, salvação em
acidentes, superação de problemas na família, conversão a Deus, conseguir uma
profissão, encontrar o amor de sua vida.
A peregrinação em grupo até o santuário é uma bênção. As
comunidades se organizam. Durante a viagem, os romeiros compartilham o
alimento, conversam, rezam, brincam. Fortalecem os seus laços. Os que vem a pé
experimentam a liberdade interior, a dureza do caminho, o desapego, a busca do
essencial.
Os 300 anos de Aparecida coincidem com um momento difícil da
nossa história. A bênção ainda não penetrou na sociedade como um todo, especialmente
na política e na economia. A CNBB denunciou esta situação. Os poderes em
Brasília praticam o roubo e a iniquidade abertamente, defendendo seus próprios
interesses. O governo, com o apoio dos deputados e senadores, diminui as
oportunidades aos mais pobres e favorece a elites. Retira direitos sociais. Faz
leis injustas. Membros do judiciário condenam e prendem sem provas. E mandam
soltar pessoas corruptas que se enriqueceram com o dinheiro do povo. A ecologia,
os direitos dos povos indígenas e dos quilombolas estão ameaçados. Nossa
Senhora Aparecida está muito triste com tudo isso. Como a Rainha Ester, o que
ela mais deseja é a vida do seu povo
(Est 7,3).
Que este ano mariano tenha despertado a consciência social e o compromisso de muitos cristãos. Que a
bênção de Aparecida se transforme em vida plena para todos os brasileiros(as),
a começar dos mais pobres, como aconteceu há 300 anos, nas margens do rio Paraíba.
Amém!